quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A CULINÁRIA BAIANA NO TEMPO DOS MEUS AVÔS

. A culinária geralmente obedece a tradição familiar ou regional, e a Bahia não foge da regra. Já dizia o Afrânio Peixoto, historiador regional. “ A Bahia é um feliz consórcio do melhor de Portugal a sobremesa e a preferência pelos pescados, e da Costa Africana o óleo de dendê, com outros temperos, condimentos e pimenta, pode-se benzer tudo”. Mas, a vinda de emigrantes e pessoas de outras regiões brasileiras, trouxeram hábitos diferentes e colocaram outras iguarias no cardápio baiano. Mas isso não diminuiu a chamada comida típica baiana de tradicional sabor e fama até no exterior. São poucas as famílias que ainda conservam a tradição dos círculos de festas aliado à culinária, por exemplo: Semana Santa e Quaresma não se podia comer carne de qualquer espécie. Neste período de abstenção a alimentação do católico era frutas, legumes e “comida baiana” chamado pelo povo: caruru, vatapá, arroz, efó, farofa de dendê com camarão seco, peixes diversos, mariscada, feijão com leite de coco, pão e vinho. Normalmente, nas datas festivas dos santos católicos, principalmente de São Cosme e São Damião, era servido às iguarias acima com muita algazarra de crianças e muito doce. Está tradição foi sistematizado por brasileiros descendentes de escravos africanos que trouxeram para o Brasil no período da escravidão. As comidas são do preceito do Candomblé que oferece essas “comidas de santos” como são chamada na seita. Na véspera e no dia de São João a culinária faz outra mudança bem nordestina: canjica de milho verde, bolo de vários sabores, milho cozido e assado, pamonha de milho e de carimã, beiju, arroz doce, batata doce, inhame, aipim, laranja, cuscuz de milho, tapioca e carimã. Contando com a tradicional “fogueira de São João”, fogos de artifícios, bandeiras multicoloridas e principalmente o afamado licor de jenipapo, havendo outros sabores Não posso esquecer dos afamados Mingaús de vários sabores; milho, arroz, tapioca, mungunza e carimã eram as delícias da garotada. Vamos acompanhar abaixo a relação de comidas baianas: Moqueca de peixe com cozido do caldo, imerso em dendê, com farofa (farinha molhada no mesmo dendê). Frigideira diversos sabores de camarão fresco, siri, ostra e mexilhões. Vatapá, caruru, peixe, mariscos, galinha de molho pardo e xim-xim de galinha com dendê, arroz, fruta pão, efó, xim-xim de bofe com dendê, peru, pato, sarapatel. Carurú – Pode ser feito de quiabo, bredo de mangangona, língua de vaca. Efó – Pode ser feito de tapioca, língua de vaca, bredo, espinafre, transforma em purê. Xim-xim. Deve ser feito de galinha, pato ou peru. Arroz de Auçá ou Usá – É o arroz dos haussás como também fora chamados, etnia africana vindo para a Bahia como escravo e deixou o seu hábito para os descendentes e culinária baiana. Preparo o arroz mole com água e sal. Acarajé, feijão fradinho, feito em purê, frito em dendê com forma de bolinho, molho de pimenta malaqueta cozida. Bobó de vários sabores; aipim, inhame, mandioquinha e de fruta pão. Moqueca de pititinga, envolvida na folha de bananeira. Feijão com leite de coco e feijão com dendê. Moqueca de galinha com camarão seco, dendê, alho, sal e ori, fruta africana para tempero. Arroz de cuxá é o arroz branco cozido sem sal, formato de bolo que acompanha o vatapá. Ecuru, farofa com feijão fradinho e camarão, cebola, sal e dendê. Zambê, farinha molhada no dendê. Abu, banana assada com azeite e tempero. Latipá, folha de mostarda molhada no dendê. Aturé, molho de pimenta malaqueta cozida e torrada que se transforma em pó. Afum-aquedê, purê de língua de vaca. Muganga, tempero de raiz de mostarda com folha de taioba. Irerê, é tempero de raiz da abóbora. Guenga, é tempero de raiz salsa seca. Abará, feito de feijão fratinho enrolado na folha da bananeira ou abará de flor de arroz, não leva dendê é mais leve. Carne do sol, com pirão de leite. Feijoada baiana, com verduras, carne seca (xarque), carne de porco ou de carneiro assado. Sarapatel, miúdo interno do porco. Mininico de carneiro, parte interna do carneiro. Cozido baiano, verduras a gosto, carnes diversas, chouriças e o famoso pirão do caldo das verduras. Galinha de molho pardo, é pedaços de galinha ou frango com sangre do mesmo. Também pode ser com pato ou peru. Rabada, é o rabo do boi, cortado em pedaço com pirão. Quiabada, leva quiabo cortado em miúdo, com camarão seco, abóbora, carne seca, carne salgada e chouriça. Quibebe, abóbora e carne seca torrada, banana da terra. A sobremesa é de origem portuguesa, indígena e doces franceses: Canjica de milho verde, pamonha de milho, arroz ou carimã. Arroz doce, com leite de coco e canela em pau ou em pó. Cocada, mole de rapadura puxa ou de coco ralado. Pé de moleque ou amora, leva amendoim frito e açúcar queimado. Beijú de forno, leva coco ralado. Requeijão frito, com açúcar e pó de canela. Acompanhado com refresco de umbú, extrai o sumo da fruta com açúcar e água a gosto, serve-se gelado. Refresco de jenipapo extrai o sumo da fruta, leva açúcar e água a gosto. Também, chamado de Aluá, o sumo da casca do abacaxi em descanso com água, rapadura ou açúcar, leva dois dias. Vamos ler a narrativa abaixo: “No tempo de Brasil Colônia e Império as sobremesas e doces, eram de especialidade dos Conventos, geralmente regidos por freiras francesas; mãe benta, sopa de frade, biscoitos do bispo, palha de abade ou fios de ovos, barriga de freira, fatias celestes, bolo da trindade, hóstias, papos de anjos, mistérios, toucinho do céu, baba de moça, beijinhos, bolo do amor, beijos de moça, suspiros de donzelas, lacinhos do amor, bolo da esperança, língua de moça, bolinho dos esquecidos, desmamados, casadinhos (duas bolachinhas com geléia de pêssego), apressadinhos, fatia de parida, bons bocados, levanta velho, delicias, marmelo recheados, melindres, mexericos, lamurias. Havia os confeites e sequilhos do Convento da Soledade, principalmente a geléia de mocotó do Convento do Desterro e os doces; doce de banana, queimados de água de flor, canjica de milho verde. Convento da Lapa; xarope de angico, um santo remédio para os pulmões. Os inesquecíveis sonhos, queijadas de coco, pastéis folhados dos Perdões ou de São Raimundo. Ainda tinha as guloseimas do Convento das Mêrces que eram uns verdadeiros manjas dos deuses.E assim as lembranças põem em minha boca os sabores bem gostosos: pão de ló, flor de polvilho, leite frito, bolo de comadre, espuma de praia bolinhos bordados, bolo de São João, bolo de aipim, doce de Jeremias”(Fonte do livro “Breviário da Bahia”- autor Afrânio Peixoto) Pesquisa de Álvaro B. Marques. SSA,29.10.2012

sábado, 27 de outubro de 2012

O QUE A HISTÓRIA NOS CONTA - LEGADO




Vamos ler o que nos conta o historiador Afrânio Peixoto em seu livro “Livro de Horas” publicado em 1947 e que fora um dos maiores divulgadores da História da Bahia antiga.
“O maior legado que a Santa Casa da Misericórdia recebeu, em toda a sua existência. Foi o legado post-morte do João de Mattos de Aguiar ou capitão João de Matinhos nome que o povo batizou este benemérito. Faleceu na Bahia em 26 de maio de 1700 deixando para a Santa Casa da Misericórdia mais de hum milhão de cruzados para obras pias, dos quais, cerca de cem mil destinados ao recolhimento de órfãs.
No nosso passado, bem distante, as pessoas de bens e religiosas, tinham a obrigação de deixar para a Irmandade, quando não havia herdeiros, seus bens e fortunas. Em troca, a Irmandade daria jazigo perpétuo, missas rezadas para a respectiva até a consumação do século e no caso de haver no legado alguma herdeiro junto com a Santa Casa da Misericórdia seria esta pessoa avisada e não passava desta pessoa. E seus nomes imortalizados nas casas pias.
O dinheiro de João de Matinhos parte das órfãs seria posto a render (a Stª Casa emprestava dinheiro a juros de 6 ou mais por cento ao mês) e a manutenção do recolhimento. Em 29 de junho de 1716 foi inaugurada com oito recolhidas a regente e porteira foi escolhida e teria que ser “senhora nobre e da maior reputação”.
“O edifício na época era na rua da Misericórdia, casarão ligado à Capela de Santa Casa por um arco( semelhante ao que tinha na Igreja da Sé com o Paço Arquiepiscopal, fazia a comunicação), chamado de “Arco da Misericórdia”. Hoje já não mais existe, aparece a parede vedando. Neste recolhimento, no térreo, estava instalado o “dispositivo” chamado de “roda” ou “Casa da Roda” para receber os “enjeitados”(crianças  abandonadas). Era um compartimento de madeira que circulava quando colocava-se  uma criança sem ser vistas de dentro. Desde 14 de janeiro de 1738 que os “enjeitados” eram criados, meninos e meninas no recolhimento em área separado.”
“Havia neste período outra obra de proteção a órfãs desvalidas, criadas pelo Padre Francisco Gomes de Sousa, constituiu o Colégio de Órfãs do Santíssimo Coração de Jesus, na própria casa à rua de São José de Ribamar, freguesia de Santo Antonio Além do Carmo de 1827 á 1847, quando recebeu o legado de Francisco Meuron (fabricante de “pó de rapé”) Suisso. Cujo valor foi 50:000$00 que se achava depositado no Banco para o Asilo de Mendicidade. O beneficiente morreu longe daqui. Com esta caridade, foi adquirido outro edifício, reformado, na rua da Cova da Onça. Inaugurado em 1857 onde se estabeleceu o Colégio com 120 órfãs sobre a direção das irmãs de caridade francesas.”
Sobre este assunto, também escreveu o livro: “A Bahia no século XVIII” do autor: Luis Vilhena – págs. 111 a 119 – carta II nota e comentários de Braz do Amaral coleção Bahia. Seguiremos abaixo:
João de Mattos e Aguiar: “Vulgarmente conhecido pelo apelido de João de Matinhos. Este filantropo, ao morrer deixou para á Santa Casa da Misericórdia a sua fortuna avaliada em 228:000$000 mil réis, instituindo que a Misericórdia, fizesse uma casa de recolhimento para crianças e mulheres. Ele fora escrivão e provedor da Santa Casa. A princípio chamava-se de “Recolhimento Santo Nome de Jesus”, sendo inaugurado em 29 de junho de 1716 e extinto em 7 de janeiro de 1869. O recolhimento foi transformado no Asilo dos Expostos que primeiro existiu no pavimento térreo do edifício da Santa Casa, vindo depois para a chácara do Pinheiro ao Campo da Pólvora – Pupileira, antiga “Roda”.
Extraído do livro de relatório da Santa Casa de Misericórdia da Bahia – período 1843 a 1856 – tipografia de L.A. Portella e Companhia – mês de agosto de 1843. Relatório escrito por vários Tesoureiros em seus balancetes. REL. BA – SCM 1843 – CÓDIGO. Leia-se: “ José Bento Gonçalves, homem de grandes posses e muito religioso. Ao morrer, sem familiares em vida, deixa seu testamenteiro a incumbência de comprar para a Santa Casa de Misericórdia da Bahia, dois imóveis no valor de 31.000$000(trinta e hum mil contos de réis) a quem ficarão pertencendo, com a condição de serem os rendimentos (alugueis dos imóveis)  dela aplicado para o sustento em vida de dois escravos, que o mesmo falecido libertou, um dos quais já não existia, e por isso, só o rendimento de uma está abrigado às condições.”
Legado -  Em 19 de março de 1710 D. Loureça Maria possuidora das terras na Península de Itapagipe nesta cidade, fez doação de todas as terras e a Capela da Boa Viajem com ônus para o Convento de S. Francisco e mandou fazer anualmente missas por sua alma e duas pela alma da sua filha D. Maria Pereira de Negreiros. Em 1712 foi construido neste local, um hospício e reedificaram a Capela com donativos de devotos muitos eram marinheiros. A Capela é pequena, simples e muito elegante, o templo no qual se faz com pomba a festa do Senhor Bom Jesus dos Navegantes no primeiro dia de cada ano; e também é celebrado a festa de Nossa Senhora da Boa Viajem no mesmo dia." (Fonte: Resumo Cronológico e Noticioso da Província da Bahia desde 1500 a 1885 - págs. 56 autor: José Alvares do Amaral.)
Observação do pesquisador: Só que o contemplado nunca soube deste legado isso é, no caso dos escravos. Este tipo de disposição é encontrado em vários testamentos em vista nos relatórios. Há casos que os herdeiros legítimos familiares estavam na miséria e não sabiam do testamento e outros quando souberam a maior parte ficou com a Santa Casa. O legado para os escravos de confiança sempre existiu no período da escravidão brasileira. Porém, poucos receberam e muitos foram ludibriados por advogados inescrupulosos. A morte não deixa aviso, mas a fortuna do morto tem sempre um destinatário.
As instituições religiosas, Irmandades e Ordens Terceiras até o inicio do século vinte admitiam seus irmãos com cláusulas normativas ao legado. Não raras as famílias ricas e pessoas de bens que não deixavam alguns bens para uma dessas caridosas instituições. Só que as necessidades pessoais foram aumentando nos fiéis e diminuindo a fé do religioso na caridade. Mostrando que há outras maneiras de se fazer Caridade sem interesse de perdão em missas seculares.
O homem temente a Deus já não mais existe. Hoje existe o homem sabedor que um Deus existe sem cobrar, sem exigir do homem a perfeição, sem sacrifícios no corpo e sem penitência na alma. Hoje o homem é livre para escolher a sua religião.
Os legados dos séculos passados foram atitudes filantrópicas, incentivado pela religião católica para todos os fiéis. Pode ainda existir para a ciência e a educação, essas são bem vindas.


Álvaro B. Marques.
SSA, 25.10.2012

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

É BOM SABER. A VOZ DO TAMBOR




Nota de esclarecimento: BATACOTÓ tambor de guerra dos africanos escravos na Bahia na época da escravidão. Instrumento de comunicação entre a comunidade distante. Em razão de sua forte potência sonora. Também usado no culto para atrair adeptos em dias festivos. Era grande de madeiras oca tipo cilindro cônico na abertura maior circular havia um revestimento de couro de animal que tampava a entrada, permitia que o tocador ali marcasse o som com as mãos. Este instrumento foi caçado e destruído pela repreensão policial no período de 1835 a 1840 o chefe da polícia era o Dr. Francisco Gonçalves Martins, mais adiante recebeu o titulo de Visconde de São Lourenço na Bahia. A proibição chegou ao nível de não mais fazer o tambor e não permitir a sua importação. Quando não tinham instrumentos musicais eles faziam o compasso do som com as mãos. Mais um ato de violência contra a cultura dos escravos africanos que perderam pouco a pouco a sua raiz milenar. O medo da repressão muitos uniram-se com outras seitas para surgir o Candomblé de hoje na Bahia. Mas não era somente com o tambor que havia a comunicação entre eles, o búzio pendura na roupa ou embutido no anel demonstrava ser adepto da seita o que mesmo dizia das reuniões escondidos. As mulheres passaram a usar nas orelhas o búzio como adereços e proteção dos Deuses não chamavam muito a atenção por ser  hábito. Os homens de procedência muçulmanos usavam além dos gorros uma barbicha de tradição Malê para diferenciar das outras etnias. As roupas (abadá) e gorro somente usavam no culto ou em reuniões secretas. Os alforriados e livres depois das duras repressões, prisão com açoites e deportação, os revoltosos se refugiram no interior da Capital e outros foram para  Estados vizinhos, deixando de usar os adereços comprometedores. Negando assim a sua origem de nascimento para assumir novas atitudes e poder viver. Os atabaques continuam a sonorizar nos terreiros confirmando o poder dos Orixás.




Álvaro B. Marques – trabalho de pesquisa

ESPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO DA BAHIA/PORTO



EXPORTAÇÃO E IMPORTAÇÃO DA BAHIA/ PORTO
                       (século 17 e 18)
“A Bahia importava da praça de Gôa/África as seguintes mercadorias vindas das Índias: Louças, fazendas (tecidos) pimenta do reino, canela, cravo, tapeçaria e pedras preciosas; esmeraldas e rubis. Outras mercadorias (especiarias) vinham acondicionadas em frasqueiras; perfumes e cremes para o tocador e de remédios, vasos ornamentais, garrafas de licores e outros objetos em cerâmica finas, além de louças da China compradas a preço de trocas de rolo de tabaco. Isto foi no inicio do século XVIII.”
“Nos primeiros anos do século 17, o governo português, proibiu no Brasil a fabricação de aguardente para que fosse consumida somente o aguardente vindo do Reino. Posteriormente foi facultada a sua fabricação, cuja exportação foi proibida para Angola, até que no meado do século 18 foi permitida a entrada na África.”
“Durante os séculos 16, 17 e 18 a Bahia fez comércio em larga escala com as possessões portuguesas da África, exportando fumo, algodão, açúcar, aguardente e zimbo (concha marinho, univalve, que os antigos congoleses usavam como moedas) e trazendo escravos. Até o ano de 1770 a Bahia preponderava naquele comércio, diminuindo depois do desmantelamento comercial e a concorrência da Inglaterra.”
(Fonte do livro: “Novos Documentos Para  História Colonial” – autor: Francisco Borges de Barros – Imprensa Oficial da Bahia – 1931)
Conforme Adonil, no liminar do século XVIII, o tabaco brasileiro revelava-se ainda mais lucrativo do que o açúcar. Considerado o melhor do mundo, era ávidamente adquirido pelos mercadores manchús da China em Pequim e pelos trigueiros potentados do Daomé. A melhor variedade de folha vinha da região de Cachoeira, que em 1726 produziu mais ou menos 20.000 rolos escolhidos como os melhores “ e outros tantos de qualidade inferior que deviam ser exportados para a Costa da Mina. A safra foi classificada em três qualidades a melhor sendo reservada para Portugal e a terceira categoria para a Guiné, mas tal regulamento ficara muitas vezes burlado na prática.
O tabaco da Bahia era exportado em rolo ou em pó “rapé”, nunca em folhas, disse um viajante francês de nome Dampier no ano de 1699 quando o mesmo seguiu viajam para África e assistiu o embarque e desembarque da mercadoria.
“O tabaco era conhecido aqui no Brasil com o nome de “erva santa” tinha o consumo muito grande, principalmente em forma de “rapé”. Consumido por todas as classes sociais, tinham esse hábito, usavam como “rapé” cheiravam o pó, usavam nos cachimbos e mascavam o fumo em pedaços de rolos tipo corda.Embora o açúcar, a cachaça (aguardente) fumo e o algodão fossem os principais artigos de exportação comercial da Bahia, a produção de ouro no interior da Capital estava longe de carecer de importância. Porque os Distritos mineradores de Jacobina e Rio das Contas foram descobertos no inicio do século XVIII mas durante mais ou menos 20 anos a coroa proibiu a sua exportação, sob o pretexto de que isso poderia encorajar ataques a Bahia e privar as plantações de açúcar e de tabaco do trabalho escravo. Não permaneceu esta proibição por muito mais tempo. Em 1727, ricas descobertas eram feitas nas regiões de Araçuí e Fanado em Minas Gerais sobre a vigilância do vice-rei da Bahia, durante muitos anos”
(Fonte do livro: “A Idade de Ouro do Brasil” – autor: C. R. B pág. 143/144 reeditado em 1963)
“O Brasil não só abastecia o Reino de produtos tropicais utilizados na alimentação (açúcar, farinha de mandioca, café, arroz) como ainda sustentava a produção das fábricas do Reino, dando-lhe o algodão que iria servir de matéria prima. Além disso, o ouro, o couro e diamante serviriam para o comércio. Outros gêneros brasileiros como o tabaco e drogas que entravam em Portugal dando lucro não só às Alfândegas do Reino como aos negociantes portugueses que se dedicavam a importação e exportação e que tinham a sua principal receita nos produtos coloniais.”
“Com os portos portugueses da Europa fechados devido a invasão dos franceses, era absolutamente necessário um interposto para os produtos portugueses, fossem eles os de África, Ásia ou da própria metrópole. O Rio de Janeiro, mesmo antes de 1808, já era o porto de entrada para os navios que iam e vinham da Ásia para Lisboa; fazendo do Rio de Janeiro o interposto de todos os produtos portugueses.”
“O comércio com a Ásia motivou a importação e exportação dos transportes marítimos. Criando assim uma frota considerável e os receios dos ataques piratas eram sucessivos foram os franceses, ingleses e holandeses que abordavam os navios brasileiros que viajavam abarrotados de produtos em grande valor comercial.
Foi necessário pedir autorização ao Reino para acompanhar cada navio uma nave armada em comboio ida e vinda, como segurança.”
(Fonte extraído do livro: “Relação Comerciais entre Portugal, Brasil e África Balança do Comércio em 1801/1821 – autor; Maria de Lourdes Roque de Aguiar Ribeiro) e do livro:Comércio Português na Bahia 1870/1930 – autor: Mario Augusto da Silva Santos.

“Os riscos existentes no comércio marítimo da época, levavam os negociantes e mercadores dos séculos XVI E XVII, a procurar valer-se da proteção divina. As expressões “com a favor de Deus”, os nomes de dois santos nas embarcações, eram sinais de que no entendimento daqueles que comerciavam, nada havia de certo, sem a referida proteção. O mecanismo do comercio colonial porém, mais forte que o temor dos caminhos marítimos ou os perigos oferecidos pelos sertões, impulsionava os mercadores a completar seu ciclo de transportes de mercadorias e suas trocas como sabemos, e efetivamente, pelos exemplos das “carregações” aqui expostas. Vindo de Portugal ou da Ilha de Madeira em troca de açúcar e tabaco, produtos regionais da Bahia, aguardente e os tecidos que iam à África em troca de escravos, novos, sem defeitos (moleques e molecas) que seriam marcados com cachimbo na parte visível do corpo de preferência o ombro ou rosto.
Os produtos brasileiros, aguardente e fumo, sendo trocados por escravos ou enviados a outros pontos de comércio. Tecidos da Índia ou de Hamburgo e da França, aqui vinham e eram transacionados, também servindo para negocio tanto na África como no interior do Brasil, em troca de ouro. O maior interesse dos comerciantes da Bahia eram os escravos da África e o ouro das minas da região de Benin,Benguela, Costa de Minas e Angola”.
(Fonte: “Letras de Riscos” e “Carregações” no comércio colonial da Bahia – 1660/1730 conforme consta nas páginas 31).
NOTA DO PESQUISADOR:Em épocas de crises financeiras no período Colonial e Imperial os senhores de Engenhos, hipotecavam seus bens, imóveis, fazendas, chácaras, jóias e muitas vezes não tinham como pagar as dívidas. Perdiam seus bens para a Santa Casa da Misericórdia e Caixa Econômica, até as Irmandades socorriam seus irmãos como era o caso das Irmandades mais ricas do Carmo e do São Francisco. Faziam comércio com seus escravos e contratavam serviços para seus escravos sem direito ao mesmo ter participação nos ganhos, era comum essas atitudes.
“Em 3 de novembro de 1844, houve um pavoroso incêndio no comércio – cidade baixa, ameaçando o edifício da Alfândega. Pela 1ª vez, funcionou na Bahia uma bomba contra incêndio, adquirida na Inglaterra por pedido de comerciantes da praça à Associação Comercial. A máquina bomba chegou em 10 de outubro de 1844. Para isso, teve os comerciantes de constituir um batalhão de Brigada de Incêndio por conta própria.” Fontes “Vida Econômica Financeira da Bahia de 1808 a 1899 – autor: Francisco Marques de Goés Calmon// Fato extraído do número especial do Diário Oficial, publicado em comemoração ao 1º centenário da nossa Independência em 2 de julho de 1923. Impr.Oficial do Estado – 1925 SSA/BA.
“Em virtude do Decreto nº 1.746 de 13 de outubro de 1869 o Governo Imperial reconheceu a necessidade da construção de Docas em vários trechos do comércio. Seriam executadas por Empresas particulares, foi preferida a proposta para a construção das Docas do Porto da Bahia com exportação dos construtores, será realizado pelos herdeiros de João Gonçalves Ferreira, cujos senhores já havia proposta de alargamento
da zona portuária até o Forte de São Marcelo com extensão a São Juaquim. Infelizmente por vários motivos foi adiado pela companhia organizadora com sede em Londres, através do Visconde de Mauá.” ( Fonte a mesma acima)." A Companhia havia sido incorporada em Londres em 11.10.1871 sob o nome de Bahia Docks Company Limited com o capital de L900.000 dividido em 90 mil ações com aval de Irineu Evangelista o futuro Barão de Mauá.
Visconde de Mauá – Irineu Evangelista de Sousa foi um empresário, industrial, banqueiro e político brasileiro. Nasceu em 28 de dezembro de 1813 em Petrópolis e morreu em 21 de outubro de 1889. Viajou para Londres por várias vezes para encontrar soluções para a sua situação financeira. O Fórum Judicial eram em Londres e os contratos obedeciam as leis da Inglaterra, mais um motivo que levou a falência. Foi o maior empeendedor brasileiro do Império.
NOTA COMPLEMENTAR:
"O Porto e a sua ampliação foi concedido aos Bacharéis Francisco Ignácio Ferreira e Manuel Jesuino Ferreira ou à Companhia por eles filiado com privilégio de 30 anos para construirem cinco docas e aramazens para carga e descarga, guarda e conservação das mercadorias de importação e exportação. Obras com conexões e melhoramentos no porto desta cidade, desde a Alfândega até Jequitaia. Contra tal concessão recorreram e representaram muitos proprietários comerciantes que se julgaram com direito as margens fronteiras do mar às suas propridades. Foram ao Governo Imperial pedindo a preferência em semelhante concessão, mas não foram atendidos. Como também havia os grandes importadores por serem proprietários dos Trapiches que por sua vez armazenavam os produtos de importação e exportação. Havendo por isso mais um entrave no projeto de modernização do Porto de Salvador que durou vários anos para ser realizado o modelo que vemos hoje e que já é ultrapassado. A Bahia deveria ter o maior porto do Brasil por sua localização estratégica com os países africanos e europeus.
           




Trabalho de pesquisa de Álvaro B. Marques



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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A RUA DA MANGUEIRA E SEUS MORADORES NO PASSADO

Já foi chamada de Rocha Galvão e hoje voltou o nome antigo Rua da Mangueira, transversal a av. Joana Angélica, perto da Rua da Mouraria e defronte ao Quartel da 6ª Região Militar do Exército. Local muito tranqüilo na minha época no período de 1950 a 1970 quando ali cresceram vários das personagens que vão compor este artigo. Morei em casa, nesta rua, nasci e cresci junto com mais quatro irmãos, Alvair (Memeu) Altair (Tatá), Aldair (Dadá), Antonino (Tadeu) e Àlvaro (Bentinho) eu. Casa grande, como a maioria das casas antigas de Salvador. Casa com cinco quartos, sobrado recuado, sala de visita, sala de jantar, copa-cozinha, quintal com árvores frutíferas, para ali brincar com os irmãos. Rua estreita, com casas nos dois lados e calçamento em pedras negras de tamanho irregular que formava em sua volta gramas para maior trabalho dos garis da prefeitura fazerem a retirada periodicamente. Nesses dias os meninos não jogavam bola na rua e ficavam apreciando os trabalhos de limpeza que era um divertimento a mais. Não era rua movimentada, pacata, pouquíssimos carros trafegavam. Anos depois, tornou-se um inferno. Na saída de Antonio Carlos Magalhães que também era um dos moradores resolveram fazer dessa rua passarela de estudantes de vários graus de ensino. Antes havia a Escola Joanna Angélica e o Ginásio Nossa Senhora do Carmo que se estendeu para Faculdade de Educação de Olga Pereira Mettig, grande nome da educação baiana. Já na década de 70 foi transformado o casarão nº 19 em Delegacia de Furtos de Veículos. O comércio avançou e tirou toda a tranqüilidade, desapareceram as antigas famílias. Restaram somente as lembranças como essas: Em cima dessas pedras irregulares, os meninos jogavam o baba com bola de meia a principio, depois com bola de borracha e mais tarde com bola de couro, empréstimo do nosso amigo e vizinho Paulo Maracajá Pereira (o filho do padre), ele era o único da minha turma que tinha está bola. Havia duas turmas de garotos, uma chamada dos grandes, e dos médios. A turma dos grandes eram composta de rapazes que tinham idades entre 16 a 18 anos, quase todos estudantes, chamados no apelido; Litinho (Budião), Pirão, Balaio, Zé Oswaldo, Celso Figuerôa e irmão, Oscarito, Bito, Bastinho, Memeu, Zé Preá, Vavá, Miro, Dilson, os irmãos Arqueláus, Macarrão, Sílvio, Celso Santiago (o gordo), Norte, Waltinho, Carlos(cachaça)Dondôla e outros que não tenho lembranças. Porém, nem todos moravam na mesma rua, alguns em ruas circunvizinhas, por exemplo: Mouraria, Cantanheda, Palma, Bângala, Independência, Tororó, Campo da Pólvora, e etc. A turma dos médios foi: Nonô (Rockfeller), Dodô, Edinho, Ítalo, Fernando (tocava violão), Chico Amaral, Raimundo Amaral, Manoel Amaral, Doto e seu irmão, Badaró e seu irmão, Zé Carlos e seus Irmãos Jambeiro, Perereco, Raimundo Piloto, Badiega, Beni Paulo Maracajá, Pretinho, Pascoal e seus irmãos (Lula e Gordo) Aécio Pomponet e seus irmãos, Pereira, Maurício e Bené, Cristovam, Tadeu, Bentinho, Antonio José (Zé chiapeta, irmão de Ítalo e Perereco), Silvio o grande, Osvaldinho, Rutival e outros que a memória não lembrar. Esses com faixa de idade variável. As turmas se reunião quase sempre na escadaria da Escola Joanna Angélica para conversação e jogar o baba no campo dessa Escola. Ficava defronte ao Ginásio Nª.Sª do Carmo. Havia o revezamento das turmas para jogar a “pelada”. Lembro-me muito bem do jogo “os nus contra os cuecas” esse foi o nome oficial dos times, imaginem o que ocorreu. Neste local era a nossa segunda morada, nosso ponto de encontro diurno e noturno nas escadarias da escola. Local que anos depois, fechou a Escola e abriu-se como aluguel de cômodos. Acabou o nosso ponto. Mas em qualquer local da Rua da Mangueira fazíamos reuniões. Tínhamos muitas brincadeiras de mau gosto e cantigas provocantes e maliciosas, como esses versos: “Olé, olé bambú Fio de negô é urubú A mangueira escureceu O pretinho apareceu Trocando com Diouro Rockfeller se meteu.” O inventor do verso malicioso chamava-se em apelido “incarcado”, cujo nome verdadeiro é Mauricio Cardoso. O verso referenciava a seus companheiros e os quais ao saberem não gostavam do infame trocadilho. Veja outro versinho bem chocante: “Negô fio de um porco Cabeça de vaga-lume Quando vê o pau do jegue Pensa que é lança perfume.” Caía em cima do único pretinho da turma, chamado em apelido de “pretinho”. Seu verdadeiro nome até hoje ignoro. Mas para a turma o nome não era necessário bastava o apelido. Só poucos eram chamados com seus nomes verdadeiros. Tínhamos um livro de bordas de “ouro” para angariar dinheiro, por meio de assinatura de pessoas no livro e após, recebíamos dízimas que seria revestido para a compra de uniformes de futebol. Para termos êxito teríamos que bater em porta em porta e recitar um texto da fundação do “time”, era mais ou menos assim: “Já nos tempos antigos os povos civilizados, romanos e gregos, reuniam-se em concentração esportiva para fundar um clube...” e levava alguns minutos para o orador (geralmente, escolhido) encerrar a ladainha e, após a recitação era entregue ao dono da casa ou a quem nos atendeu o livro de “ouro”, para ser assinado e logo a seguir receber a moeda ou papel moeda. E assim percorríamos um quarteirão. No final, o dinheiro arrecadado era gasto na sorveteria Manon do Campo Grande ou na Cubana no Elevador Lacerda, ali havia uns deliciosos bolinhos de arroz e um famoso Milkshak de sabores diversos o mais disputado. Na praça em frente ao Quartel da Mouraria, havia um extensivo largo com declive. Era o local da garotada para “saltar” ou “empinar” arraia (pipa) e quase sempre ao saltar a linha, com arraia no ar, cantávamos está ladainha: “Afrouxa quem tem coragem, deixa de galinhagem”. Este verso, curto e provocativo dava raiva no outro jogador de arraia, pois ele não queria ir muito longe com a sua linha e tinha medo de ser partido por outra arraia de linha temperada ou com gilete na rabada. Esse era o motivo da canção e geralmente tinha brigas. Neste mesmo local, fazíamos de tudo. Jogávamos baba, passeávamos de patinete feito de madeira e rolimã, pedalávamos de bicicleta, e o que mais gostávamos era de ver os desfiles militar em dias comemorativos. Depositavam coroas de flores e havia tiros de canhão em homenagem ao Patrono do Exército Duque de Caxias. Isso era o máximo para a garotada. Nossos cinemas prediletos eram os Cinemas: Pax, Santo Antonio (passava dois filme e uma série), Aliança e Jandaia. Havia outros, Cine Guarani, Excelsior, Liceu e anos depois surgiram mais. Lembrando bem, a maioria pertencia ao grupo de Pithon. Quando íamos ao cinema, era acompanhado de quatro ou seis meninos. Lembro-me que certa vez fomos ao cine Pax ver um filme histórico. Enfrentamos uma longa fila, dentro do cinema não havia lugar vazio, ficamos em pé, então falamos com Rockfellker, o Nonô, para ele fazer uma brincadeira para arranjar lugar para sentar. Ele prontamente ficou sentado no chão (escada), e encostou-se no primeiro da fila e tirou os sapatos dos pés com as meias; neste momento exalou um terrível cheiro de chulé, o primeiro da fila que estava sentado, levantou-se apressadamente, ele o Nonô, sentou-se neste lugar e continuou a mover os dedos dos pés, para que o segundo ou outro qualquer da fila saísse, e assim, sucessivamente ele fez, até que os cinco companheiros sentaram ao seu lado. Com muito riso e lenço no nariz. Em todas as turmas tem aquele que se destaca dos demais e na turma dos médios tinha o Rockfeller, Nonô, Papinha, Santana, veja quantos apelidos. Na realidade ele chamava-se Eurídes Santana Magalhães Filho um exímio tocador de gaita e bom de bola. Como também, havia o Perereco de menor em tamanho mas um grande provocador de confusões, conhecido como porradeiro do distrito, tanto brigava como apanhava. A bebida levou-o cedo junto com o irmão Ítalo este boa personalidade e grande amigo. Na Tuma dos grandes tinham vários bons de bola, destacava-se o Balaio mais não era bom de votos. Isso por motivo de ter sido candidato a Vereador. Os rapazes da turma dos grandes assim denominados, sempre contavam suas proezas aos meninos menores. Falavam do bilhar de Abel e do seu charuto inseparável das grandes jogadas de bilhar e dos “espetos” que faziam em não pagar o jogo, lá vai correria. Depois voltavam ao local e pagavam o atrasado. Comentavam sobre o Tabaris, do Café das Meninas, do Anjo Azul, da casa de prostituição nº 63 da Ladeira da Montanha e outras casas desse gênero. Os meninos menores, não podiam freqüentar esses lugares e tinham muita curiosidade e inveja. Nem sempre as recordações da infância ou da adolescência trazem boas lembranças. As más tentamos esquecer. O tempo passa muito veloz, deixa em nós cicatriz, só para dizer que ali passou, passou nossos melhores dias da mocidade. RUA DA MANGUEIRA – 2ª PARTE Nesta rua teve moradores ilustres, como por exemplo: Casa nº 2 morou o ex-prefeito de Salvador Dr. Pimenta da Cunha, logo no início da rua. A casa despontava-se das demais, pois tinha belo jardim com estilo campestre e um chafariz, varanda nos lados da casa. Anos depois, transformou-se em pensionato, dirigido por uma família de italianos. Na casa nº 1, havia a sorveteria Primavera dos proprietários suíços e a casa nº 3 era da família do Nonô o Rockfeller, nome pomposo de um ricaço americano da época o que nada tinha do Eurídes. Mas havia o carisma da pessoa. Ele tinha um irmão Vavá e uma irmã chamada de Heleninha, muito comentada por ser namoradeira e bonita, tinha um andar de gazela. Na casa do lado esquerda, vindo da Joanna Angélica, moravam os Vellosos, Edison e Carlos, este último não freqüentava a rua, mas o outro, Edison, sim, e muito participava das brincadeiras com muito voyeurismo rolava com a irmã de Osvaldinho no telhado da Escola Joanna Angélica dava pra vê o quarto da bela mulher tirando a roupa. No nº 9, prédio de três andares com mais o subsolo, moravam quatro famílias. Neste local, morou Tom na parte de baixo, com sua pinta de galã e o uso constante de cachimbo. Casado pai de dois filhos, foi estudante de Direito. Gabriel o árabe, no andar superior e o Mauricio Cardoso e seus familiares no segundo pavimento. Este o Mauricio, muito querido por todos e o seu irmão Bené também uma boa figura humana, ambos estudante de Direito seguindo a carreira do pai. A irmã Augusta veio a casar com o Pereira nosso companheiro. O pai do Mauricio veio transferido de Itabaianinha/SE com o seu charuto cubano e o chapéu de feltro. Tinha uma rica biblioteca no apartamento onde eu e Bené ficávamos a ler e conversar sobre os acontecimentos diários. Pessoa de minha elevada estima e consideração, uma mente brilhante. Já o Mauricio, um tremendo gozador, contador de anedotas e apreciador de jogos de baralho. Repentista em versos satíricos escolheu a profissão errada. Um amigo do riso e das prosas longas. Um Gregório de Matos da Rua da Mangueira. Mais abaixo, na casa nº 12 moravam os russos, judeus, Moisés, irmão e uma irmã chamada Rebeca. O Moisés tinha o apelido de Moisa, o irmão era comunista ferrenho. Ao lado, casa nº 13, morava os Jambeiros, José Carlos, Neneca, Jorge e César. Três filhos do Sr.Jambeiro e D. Helena, família distinta, inesquecível. Vou relatar um fato muito interessante: Quando o Sr. Jambeiro, chegava perto da sua casa, na esquina da rua da Mangueira,(parte da av. Joana Angélica) e via os meninos na rua, ele da esquina assoviava e os meninos(seus filhos) largavam tudo e iam correndo ao encontro do pai, abraçava e beijava um por um. Os garotos não retornavam mais e terminava a brincadeira, ficavam em casa. O amor e a obediência era o que mais tinha naquela família. A atitude do pai para com os filhos ficou registrada na minha memória. Mais abaixo, na casa nº 15, morou a família do “padre” ele largou a batina para casar com uma das irmãs de Olga Mettig. O casal teve dois filhos sendo o mais velho o Paulo Virgilio Maracajá Pereira, o grande torcedor do Bahia, o único que tinha uma bola de couro, na época nem todos tinham esse privilégio, nós (os outros meninos) tínhamos uma bola de borracha ou de meia, dava para jogar. Ficamos maravilhados com essa novidade e pedimos ao Paulo para emprestar a bola, e ele não só emprestava como participava do baba. Depois o Paulo mudou-se e a casa passou a ser da família Amaral. O velho Amaral tinha muitos filhos, todos trabalhavam na loja do pai comerciante de secos e molhados no largo do Mercado do Ouro, Cidade Baixa. Recordo-me que bem cedo, o carro Buick (naquela época os automóveis era americanos) saia da porta da sua casa, cheio de filhos para trabalhar. Também nesta família o respeito e o trabalho começaram cedo para todos. Figura inesquecível era o Chiquinho Amaral, sempre risonho e muito brincalhão, gostava de andar armado com um pequeno revólver na cintura. Nenhum de nós sabíamos o porquê da arma. Chiquinha tinha uma brincadeira de soltar “pum” na cara dos outros meninos e depois saia correndo. Ele e mais dois irmãos, Raimundo e Manoel pertenciam a turma dos médios os outros irmãos eram já adultos. Hoje a casa é a FACCEBA- Faculdade Católica de Ciência Econômica da Bahia Defronte da casa da família Amaral, casa nº10, outro casarão, com muita área verde. Não recordo o nome da família, cresceu aí a futura namorada do nosso companheiro Ítalo ( de saudosa memória) que mais tarde veio a casar com está garota,chamada Maria. Hoje, é a Escola Estadual Mário Augusto Teixeira de Freitas. No nº 17, existe a Igreja Presbiteriana da Bahia constituída a mais de 70 anos neste local. Cresceram muito o numero de fiéis e conseqüentemente nos dias de culto a Rua se enche de carros sendo mais um motivo de fuga das famílias. Na casa nº 16 morou a viúva D.Giomar Silveira, parente do Advogado Arnaldo da Silveira. Brilhante jurista. Entre a casa dos Jambeiros e da família Amaral, tinha uma pequena transversal onde residiam dois dos nossos amigos Waltinho e Cristovam pessoas que cultivei longas amizades e sinceros respeitos até hoje. Como também, neste local, morou o Sr. José do Próximo e sua filha Andreza, era amiga das minhas irmãs. Waltinho e Cristovam trabalhavam no Fórum Ruy Barbosa. Lembro-me do Sr. Amorim e D.Alzira sua esposa, mulher trabalhadora e muito digna. Foi com muita dedicação e grandes sacrifícios que a D. Alzira criou seus dois filhos Cristovam e Graziela(Grazú). Hoje ele é um respeitável advogado e pai de um casal de filhos. A Gazú formou-se em Museologia, aposentou-se. No nº 14 morava a família Maron, senhor cacauicultor do Sul do Estado que mais tarde cedeu a mão de sua filha Arlete em casamento para fazer par com o Dr. Antonio Carlos Peixoto de Magalhães candidato a Deputado e futuro Prefeito de Salvador que passou a morar nesta rua. Ao lado no nº 16 morava o Sr. Norte, português e seu filho Nortinho rapaz de pouca convivência entre nós. Na casa n° 18 morava as três irmãs da família Torres; Naninha, Adélia e Heleninha e mais outra parenta chamada Elza Torres que fora Diretora do Tesouro do Estado da Bahia, na Rua do Pão de Ló. Nós garotos chamava a “casa das quatro viúvas”. Na casa nº 19 residia a família do médico Dr. Braulinio dos Santos, muito querido em Vitória da Conquista. Antes, nesta casa morou a família Meirelles de ilustres membros. O Dr. Braulinio além de médico era pecuarista daquela região e tinha cinco filhos, dentre eles, dois homens nossos companheiros de jogos e brincadeiras. Paulo e Dôto (Heródoto) grandes amigos. Na casa nº 20, morava a família Marques minha família. Sendo três irmãos homens que faziam parte da turma e duas mulheres. Memeu, Tadeu, Bentinho e as irmãs Tatá e Dadá. Estudantes, caseiras. Citarei um caso que houve com os meninos da turma dos médios que cantavam uma cantiga ofensiva com meu irmão Tadeu, neste termo: “Tatá, Teté, Tadeu, Bentinho, Memeu. Tadeu bateu botão de Astor na lavanderia de Arquelau”. A ladainha acima eles cantavam todas as vezes que se encontrava com as minhas irmãs, mesmo elas estando na janela da nossa casa. Uma verdadeira chatice. Até que, meu pai, homem enérgico e de poucas falas, “chofer”(motorista de Táxi) naquela época. Resolveu dar um susto na rapaziada perturbadora, e aproveitando que todos estavam juntos, encostados no muro do Ginásio Nª Sª do Carmo. Meteu o carro em cima do passeio e chegando até perto deles que saíram em debandadas. E com alta voz meu pai disse: “ Deixam minha família em paz, porque na próxima vez, meto o carro em cima pra valer”. Daí em diante não mais fizeram arrelia. Em frente a minha casa, no nº 21, morava a professora Olga Pereira Mettig com suas duas filhas. Olga foi professora e inspetora de Colégios Públicos e mais tarde, dava aulas em particular para estudantes, na sala do casarão (extinto) no local em que hoje é a Faculdade Integrada Olga Mettig. Grande educadora e escritora de livros de didáticos. A Bahia deve uma homenagem a está senhora que viveu para o ensino. Pedagoga de méritos incontestáveis. No mesmo corredor, casa nº22, morava duas senhoras idosas, solteiras, que recebia visita de um parente prelado, Bispo. Na casa nº 23, morava o médico patologista Dr. Otávio Torres e sua esposa Drª Carmem Mesquita Torres. Ele um dos fundadores da Casa dos Leprosários da Bahia, em Águas Claras no subúrbio da cidade. Como fora também um pesquisador científico, com várias teses e livros editados. Na casa nº 26, morava a família do vereador Badaró de Ilhéus seus herdeiros eram Fernando o primogênito e Niltinho o sempre fanático torcedor do Flamengo e do Vitória. Quando ele jogava baba com a turma exigia que chamassem ele de Dida (o jogador do Flamengo) na época. Na casa nº 27, morou o Celso Santiago, “o gordo” ele dizia: “ Tenho 20 anos que jogo “purrinha” na esquina do pecado (rua do Maciel), conheço todas as manhas da mão fechada”. Ele se referia ao jogo do “pauzinho” muito comentado no meio da rapaziada. Saudoso amigo o Celso, grande boêmio, bom de bola quando era magro e de copo cheio nas conversas. Morava com a mãe e tinha um irmão médico. Na casa nº 28 morou os descendentes do jubilado gramático Ernesto Carneiro Ribeiro, grande educador e médico. Hoje, no local encontra-se estabelecido uma nova Escola Pública Estadual e defronte casa nº 30, morava o ilustre professor Álvaro Costa com suas duas filhas. O professor eu não conheci em vida mas era muito estimado no meio estudantil. Defronte da casa nº 28, na Travessa Almirante Leal Ferreira, residiram vários dos companheiros de turma: Irmãos; Perereco, Ítalo, Rosa Cecília e Antonio José (chiapeta), Raimundo (piloto), Edinho, Labadiega, Beni (sua voz e seu violão). Família Orrico; Pascoal, Gordo, Lula. Família Pomponet; Aécio e seus irmãos. Sendo quer o Aécio destacou-se dos demais por ter ideais políticos e ter cometido a façanha de ter queimado a bandeira dos EE.UU., em sinal de protesto na passeata estudantil no comércio, Cidade Baixa. Um ato corajoso que se tornou histórico. Meses depois, ele foi preso junto com centenas de estudantes no Araguaia. Na década de 70 quando o País vivia na Ditadura Militar. Ainda neste local, morava José (Preá), Silvio o grande. Bem perto estava a Escola Joanna Angélica o refúgio da turma, a catedral dos acontecimentos e local sagrada das reuniões e guarda dos troféus que a turma dos grandes trazia da rua. Nós só entrávamos nesta Escola quando não havia aulas. Mais adiante, já no largo do Quartel, ainda seguindo a Rua da Mangueira, moravam outros garotos que participavam das nossas brincadeiras e conviviam diariamente. Recordo da família Carvalho, sr. Carvalhinho e esposa, com seus filhos: Balaio, Dodô e Edinho, esses três eram peças fundamentais tanto na rua da Mangueira como também eles freqüentavam o Campo da Pólvora (reduto de vários acontecimentos). Neste correio de casas, morava o Manuel Lorenzo ou Manuel Toureiro para alguns e outros chamavam de Manuel Cabeleira. Na sequência da rua, morou Bebeto, cabo Caldas e mais outros que não tenho em memória. Nas ruas adjacentes ou em outros bairros, havia sempre torneios de futebol brigas com turmas, fatos comuns. Tempo bom foi aquele, saíamos em grupo ou solitário para festas e boêmias, regressando altas horas da noite, as ruas desertas, só quebrava o silêncio com o apito do guarda noturno. Não havia assaltos nem violência nem drogas, raros movimentos de veículos. A lua clara despontava em nosso caminho. Tínhamos mais prazer de viver e participar de tudo que a vida nos oferecia. A vida era mais respeitada. Hoje, temos nossos limites por causas e efeitos que o progresso e a sociedade oferecem. Os nomes de Ruas geralmente são toponímicos e aqui em Salvador não foge a regra dos demais Estados. No caso da Rua da Mangueira referi-se a uma árvore frutífera que brotava deliciosas mangas logo na entrada da Rua. Nesta época não havia calçamento e a rua era de barro batido. O povo foi fazendo a sua história. Álvaro B. Marques.