terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O ESTRAGO APÓS A ABOLIÇÃO DOS ESCRAVOS


SEGUNDO UM CAFEICULTOR – SÉCULO XIX.
Vamos acompanhar suas palavras: “ A Lei de 13 de maio de 1888, veio a ser para mim, assim como foi para outros lavradores, um golpe duríssimo. A minha fortuna que em 1885 eu havia avaliado em cento e setenta contos de réis, desceu logo e por assim dizer de uma só vez cerca de uns trinta contos de réis, e ainda assim puramente nominais, foi eliminado sem deixar o menor resíduo o valor dos escravos, é que o valor da terra descia a cem mil reis o alqueire e até mesmo a menos, e o do pé de café a cem réis e alguns a cinqüenta e a vinte réis. Por outro lado, nem mesmo por esses preços os compradores apareciam.
É preocupante, ver-se da noite para o dia aniquilado o fruto de tantos anos de esforços, de privações e até mesmo de capitais, pois que na minha lavoura eu havia aplicado a pequena herança de meus pais, o pequeno dote de minha mulher e um grande número de contos de réis que eu havia ganhado pelos serviços de advocacia e por outros modos de trabalho. Não é, com efeito causa com que facilmente se possa resignar, sobretudo quando se vê que a causa principal do tal golpe, não passou de uma sórdida ambição de um grande número de interesse inconfessável e quando aqueles que haviam vibrado esse tão rude e tão tremendo golpe, continuavam sempre a se conservar no seu mais completo “bem bom” e que em lugar de consolar ou de condoerem, pelo contrário riam-se das suas vítimas.
Felizmente, resignado e arruinado, reconheço que é absolutamente inútil procurar remédio. A Abolição estava para mim neste caso e tendo deste logo, reconhecido, que independentemente do grande mal, que teria para o futuro de se converter em um grande bem, nem mesmo para os outros, aqueles que se tornavam uma conseqüência imediata do primeiro, isto é, que nem mesmo para a reorganização da minha lavoura eu poderia descobrir um remédio qualquer, e quem além de pronto, fosse ao mesmo tempo convenientemente acertado, deste logo, também resolvi entregar-me de olhos fechados nas mãos da providência. Felizmente, porém ainda para mim, os meus libertos declararam-me que nem um só deles se retiraria, sem que primeiro  houvesse colhido o meu café. E com efeito, não só o cumpriram como seguiram as regras do antigo regime e da disciplina.
Quando concluíram a colheita, é que então, foram reuniram-se ás suas famílias, ou para terem consciência, era natural, de que se achavam livre. Foram pouco a pouco se retirando, mas dando-lhes eu condução e saindo todos na mais perfeita paz comigo. Afinal, fiquei reduzido a um que havia sido o meu primeiro escravo e que se chamava Antonio e a duas que servia dentro de casa, mucambas, uma delas se chamava Inocência, está foi ama de um dos meus filhos, preferiu ficar comigo a ir para a companhia da mãe que havia conseguido reunir toda a família e com muita insistência para que a Inocência fosse morar com ela.
As maiores fazendas de café, haviam perdido todas as suas colheitas por não encontrar quem colher, falta de braços. E muitas foram pagas por dividas com Bancos, acarretando desespero em famílias tradicionais.
Em abril de 1889, fui ao Juiz de Fora, buscar alguns colonos italianos, e creio que não fui infeliz na escolha. Foi isto uma simples experiência e por hora ainda não sei absolutamente o que terei que fazer para o futuro. Sejam, porém, quais foram as vantagens do serviço livre; um fato para mim está desde já verificado e vem a ser bem ou mal, o escravo trabalha muito mais que o homem livre, principalmente estrangeiro. Uma vez que o seu trabalho seja em feitoria.
A segunda Lei Saraiva como vulgarmente se chama, e tendo essa lei fixado o preço do escravo emancipado, muito inferior a metade do valor atual, isto já foi grande desfalque que se deu na fortuna do fazendeiro. E essa conseqüência provocou muita desavença entre escravo e proprietário. Os escravos querendo a sua carta de alforria dentro da Lei Saraiva. Geraram vários conflitos e fugas para os Quilombos, mortes de fazendeiros e determinações judiciais. Para se ter uma idéia, um escravo moço, sem defeito, custava na lavoura de café de Minas Gerais, no ano de 1885 mais ou menos 1.500$00 (hum mil e quientos contos de réis) e a mulher nova de 2.000$00 (dois mil contos de réis), sendo o homem com ofício o valor chegava a 2.500$00 (dois mil e quientos contos de réis). Depois baixou abruptamente para 800$00, l.00$00 e até 500$00 os negros já não queriam mais saber de lavoura só pensavam em garimpar ir para os fundos dos serrados mineiros.
A Abolição, filha de múltiplos interesses, do servilismo e da especulação, tal como foi feito, muito pouco teve o ideal. Pois, deixou rastos maléficos e prejuízos irreparáveis aos fazendeiros, senhores de engenhos e todos aqueles que tinham escravos. Por outro lado, os escravos não foram preparados para serem livres, numa sociedade ainda dominada em pensamentos extremamente agrícolas, oligarquia, patriarcais e conservadoras. Muitos escravos, aqueles que tinham algum ofício se deram bem, outros preferiram ficar com seus senhores, trabalhando para eles em troca de comida e outras migalhas. Alguns preferiram ser vendeiros ou vendeiras. Outros por quentões sentimentais permaneceram sem exigir nada e poucos obtiveram a sorte de juntar dinheiro e foram mais adiante ser comerciante os chamados “letrados” e a grande maioria sem instrução, doentes a viverem mendigando pelas ruas. Alguns outros voltaram para a África com seus próprios recursos.
Esse foi o quadro degradante nos primeiros anos após a Abolição da Escravatura no Brasil. A liberdade veio trazendo misérias para uma Nação em agonia. Foi tardio, mas um mal necessário”
Trabalho de pesquisa de Álvaro B. Marques - mantido o português da época, fiel ao original.
Fonte do livro “Minhas Recordações” – autor: Francisco de Paula Ferreira de Rezende.
Págs.437 a 442 – capítulo III – publicado em 1944.
N.B.: O autor deste livro descreveu a sua vida pregresso na cidade de “Campana” norte do interior de Minas Gerais, entre os anos de 1830 a 1890

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